Liberdade, liberdade


Passaram dois dias e nem um pio. Um ai que saudades da luta de rua e das palavras de ordem e das manobras imaginativas à fuga de uma carga de porrada por ajuntamentos a três. Pois é, bastaram dois dias e já ninguém fala da celebração do dia da liberdade. Quanto muito queixam-se do calor nos pés e de uma moinha no ombro, os anos não perdoam e andar na manif de braço levantado, atiçado e punho erguido já não é para eles. E depois ninguém os pode condenar: este ano comemorou-se o dia em grande, uma grande afluência, uma grande vontade de gritar pelas liberdades que parecem andar arredadas deste nosso canto. Mas também ninguém lhes pode dizer: que calhou a um Domingo este feriado e no dia seguinte há que laborar, colaborar com os que anos atrás sanearam... É que esta coisa de Abril é como o provérbio de águas mil.

Sol


O sol chegou, entrou de rompante, mastigou o cucuruto e derretou roupas de inverno (já chega!!!). Mas queixam-se: que este não é um bom sol, muito dado a constipações velhacas, surpreendente no não sei o que vestir, desonesto nos dedos de pé que se exibem encravados por tanto mês de sapato fechado, pela moleza repentina que aperta o pescoço no pós-almoço. Não é uma cobra qualquer, é uma jibóia imensurável que nos sufoca os sentidos e faz inchar as extremidades (leia-se as que quiserem ou melhor lhes aprouver). Eu, estreante nos scarpi do último grito só tive que conter os meus, as bolhas são do imaginário e a falta de pele no calcanhar é bem provável que me dêem um dia de perna à rã. Além disso, vaidade não tem dor e o sol quando nasce... é quase para todos.

Mar


Fartinha de água na vertical apeteceu-me olhá-la noutro plano. Mar. O nosso mar é belo, é imenso, traz paz leva melancolias. Não que eu as tenha tido ultimamente, refiro-me às duas mais concretamente, mas do espirito sempre se lavam aquelas nódoazinhas incómodas e convencemos o grilo falante a calar-se para nos perdoarmos sobre o que deveríamos estar a fazer em vez de olhar o mar. Deixei o mar vazio depois de o olhar, trouxe-o comigo, troquei o meu deserto por tanta água e matei a sede de não ter preocupações e obrigações. É por isso que ele está sempre deitado.

1º de Abril


Podería ser mas não é. É mesmo um folar de excepção, saboroso, macio, com o leve travo do fruto que lhe dá o nome: Folar de amêndoas. Podía ser uma mentira, que hoje é o dia delas (a sério?! Só hoje???), mas não é. Existe mesmo o dito cujo e a comprová-lo, uma réstia de migalhas que vou lambendo dos beiços à medida que embrulho o pedaço que ultimo na boca. E a seguir vou comer mais um pedaço. E ainda outro se me apetecer. E depois ataco as amêndoas de chocolate, o ninho da Páscoa com o forro de fios de ovos, regresso às amêndoas de licor, as torradas, as francesas. E o fígado aplaude. E a balança guincha só de me ver aproximar. E na segunda-feira quando regressar confesso todos estes pecadilhos. E porque peço justiça, hei-de fazer jus ao dia de hoje e revelo que nem uma grama engordei.